O que a Énois se tornou em meio à pandemia

Diversa

O que a Énois se tornou em meio à pandemia

23 de Julho de 2020

Há seis meses a Escola de Jornalismo se integrou à Énois com o desafio de trazer algumas ex-alunas e ex-alunos da EJ para uma residência

Há seis meses a Escola de Jornalismo se integrou à Énois com o desafio de trazer algumas ex-alunas e ex-alunos da EJ para uma residência, um percurso formativo e de trabalho que potencializa a construção de saberes jornalísticos a partir da experimentação prática. Assim nasceu a nova equipe da Énois, 13 pessoas com o objetivo de mudar a cara do jornalismo enquanto aprendem – estudando, pesquisando e criando juntas.

Como o resto do mundo, não planejamos ser uma organização que aprende em meio a uma pandemia. E desde a primeira quinzena de março, quando entendemos que a distância seria necessária para a segurança de todos, passamos a recriar a forma como estávamos acostumadas a trabalhar, muito pautada em territórios e encontros físicos. Foi a conexão com os objetivos dos eixos e com o processo de experimentação em busca de reconectar o jornalismo com as pessoas e com a sociedade que guiou esta construção coletiva.

Um dos resultados é o site novo que mostra onde chegamos e para onde queremos seguir. E o vídeo desenvolvido pelos residentes que conta como a Énois está operando:

Ainda estamos de quarentena, longe do contato físico, mas bem perto umas das outras. A vontade de trocar e comunicar, em sentido amplo e abstrato, segue costurada ao desenvolvimento prático da conexão como linha condutora em nossos projetos jornalísticos – mesmo sem a presença física. É o que vemos como caminho para o jornalismo e é o que experimentamos no último semestre em cada um dos eixos.


O eixo de Jornalismo Local recriou a conexão com os territórios e os saberes que vêm dos comunicadores locais sem estar fisicamente em São Paulo, Rio, Recife e Belém, onde iam rolar as formações presenciais do curso Jornalismo e Territórios. A energia que estaria nas viagens e numa formação ancorada em trajetos e encontros pelas realidades locais foi investida em tornar essa troca possível virtualmente e o curso em um espaço também de desenvolvimento das iniciativas jornalísticas locais. Em contexto de pandemia, entendemos que junto com a formação tinha de vir apoio financeiro para viabilizar o estudo e a troca num momento em que precisamos nos ater ao essencial.

Para manter as discussões sobre como o jornalismo é feito, o Redação Aberta virou live no nosso Instagram e tratou de como produzir informação em meio à pandemia e o seu impacto para jornalistas. E na busca por nos conectarmos ao território e às territorialidades – identidades e características que nos unem –, nos juntamos a AzMina, data_labe e Gênero e Número para produzir reportagens sobre o impacto do coronavírus na vida da população negra, de mulheres e nas periferias. Lançamos uma biblioteca no Whatsapp para garantir que esse conteúdo estava chegando nas mãos de lideranças locais. Foram mais de 15 mil compartilhamentos de links.

Em paralelo à execução dos projetos, a formação da residência resgatou a ancestralidade como lente para se ver no mundo, no que veio antes e potencializar o presente – incluindo o fazer jornalístico como a Glória contou na Diversa passada.


O eixo mergulhou em estudos sobre escuta, diversidade e decolonização para entender como adequar conteúdos para jovens urbanes brasileires no projeto Reload, um canal de comunicação audiovisual criado em parceria por 10 veículos independentes de diferentes regiões do país. Ouvir a juventude e entender suas demandas foi crucial para refletirmos sobre a capacidade do jornalismo em conhecer e acolher o que está fora de suas bolhas.

O estudo conjunto guia o trabalho de conexão do jornalismo com as pessoas. A equipe leu Ailton Krenak e Grada Kilomba, teve uma aula sobre distribuição do jornalismo com Anapuaka Tupinambá, fez entrevistas e discussões para melhorar a capacidade de reflexão e, principalmente, de escuta.

A diversidade de referências dá mais repertório para experimentar formatos e a distribuição da informação sem precisar seguir a linguagem e os canais tradicionais dos veículos de comunicação.


O eixo entendeu, na pandemia, que cuidar dos jornalistas e do seu equilíbrio emocional é um ponto de partida importante para fazer o jornalismo mais humano e representativo. Essa percepção está presente no Índice de Diversidade, um passo a passo de ações e métricas para implementar e medir os resultados práticos da equidade, construído em um projeto piloto com a editoria de diversidade da Folha de S. Paulo.

O Índice é uma das metodologias da Caixa de Ferramentas da Diversidade – um site que reúne um ano de pesquisa de práticas para as redações fazerem um jornalismo mais representativo. Em breve o link pra vocês 😉

Fizemos ainda presencialmente no início de março, quando juntamos jornalistas, programadores e gestores de Recursos Humanos o Hackathon da Diversidade, um encontro para criar juntos caminhos para elevar a representatividade no jornalismo. Do encontro nasceu o Bafafá, projeto que quer identificar se as redações têm práticas de inclusão e diversidade (também falaremos mais dele em breve).


A Gestão Institucional se dividia entre a realização dos projetos e cuidado da estrutura. Mas, com a chegada dos residentes, foi redesenhada e agora tem equipe e foco em aperfeiçoar e criar métodos e processos.

Recursos Humanos cuida da equipe e acompanha a residência abrindo espaço para que se olhem para além das reuniões de pautas, planejamento, distribuição ou criação. A Comunicação Institucional compartilha os projetos que estão indo para a rua e também os aprendizados ao longo do processo. Também desenvolve uma escuta ativa pra trazer de fora práticas que podem potencializar a Énois e o jornalismo. A Captação planeja a sustentabilidade financeira da organização, cuidando de manter rede, vínculo e relações que sustentem os projetos e a equipe – mesmo sem o olho no olho dos tempos de pandemia.

O Administrativo Financeiro estrutura a grana desfragmentando e humanizando a burocracia – que é, muitas vezes, uma grande barreira durante a trajetória individual de cada um dentro da equipe. Desenvolver e praticar o cuidado financeiro transparente e consciente perante as desigualdades sociais mostra como é necessária a integração estratégica das organizações para alcançar a diversidade real. Logo mais publicaremos o Guia Financeiro com tudo o que aprendemos e desenvolvemos desde 2018 na Énois, para ajudar na criação de metodologias próprias de cuidado das finanças e projetos.

NO RADAR

► Em texto na piauí sobre o racismo na imprensa brasileira, a ombudsman da Folha, Flavia Lima, aponta que as ações com foco em diversidade na imprensa tradicional brasileira são de timidez alarmante. A composição racial das redações são semelhantes a das classes mais altas, há miopia para a desigualdade racial como estrutural e “não se entende a diversidade como um meio capaz de ampliar a visão e a perspicácia dos meios de comunicação nas coberturas”.

► O New York Times nomeou uma mulher para presidente do grupo. Meredith Kopit Levien era diretora de operações da organização e há alguns anos ela foi acusada de racismo, junto com o diretor Mark Thompson, que está substituindo.

► O Boston Globe anunciou mudanças estruturais de equidade e raça:
1. uma equipe de justiça criminal vai analisar o racismo subjacente na lei;
2. cobertura de educação e economia serão racializadas;
3. bairros com maioria de população não-branca terão mais intensidade de cobertura e pelo menos um repórter dedicado, orientação para edição e busca de parcerias para levar informações para os residentes locais;
4. ter editores negros e não-brancos em papéis importantes do jornal;
5. fazer uma auditoria de trabalho em relação a representação racial em que cada profissional terá tempo para avaliar os seis meses anteriores de trabalho a partir da lente racial;
6. redesenhar o programa de estágio de verão de 2021 para um estágio e treinamento em diversidade, voltado para jornalistas não-brancos;
7. formar um conselho consultivo da redação para refletir sobre a cobertura e as iniciativas que envolvem questões raciais.

► Mais de 20 profissionais da redação do Wall Street Journal pedem mudanças na cobertura e foco em desigualdades raciais e sociais. É a segunda ação em menos de um mês em uma das maiores redações dos EUA, com cerca de 1.300 pessoas. Entre os pedidos, houve a criação de uma editoria de treinamento e cultura e a indicação do jornalista negro Brent Jones para o cargo.

► As ações práticas indicadas pela equipe:
1. nomear jornalistas para cobrir “raça, etnia e desigualdade”;
2. nomear dois editores especializados em diversidade;
3. fazer um estudo sobre a raça, etnia e discriminação de gênero dos sujeitos das “histórias mais importantes e com uso intensivo de recursos do WSJ”;
4. levar mais diversidade para a redação e posições de liderança.

► Recurso: um guia de fontes femininas para tratar de regulação de tecnologia, na medida para apurações ligadas aos inquéritos de fake news.

 

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