O Amazonas se tornou o estado com maior incidência de coronavírus por 1 milhão de habitantes , o parâmetro que o Ministério da Saúde usa pra medir todos os estados pela mesma régua. São 250 casos a cada um milhão de habitantes, o que o caracteriza situação de emergência por estar 50% acima do índice nacional. O estado já chegou ao limite da capacidade de atendimento nas UTIs e foi notícia no Fantástico por isso e também pela ameaça da covid aos indígenas . Esta semana, o governo fala da possibilidade de fechar o estado, segundo o El País .É la que fica o Amazônia Real , projeto jornalístico fundado em 2013 que cobre a região pela perspectiva dos povos indígenas, da diversidade ambiental e da questão agrária. Katia Brasil , co-fundadora do veículo que tem mais de 40 colaboradores na região, respondeu a Diversa às 3h30 do último domingo (12/04), sobre os desafios do combate ao coronavírus e da cobertura à epidemia na região, que tem poucos leitos por habitante e grandes distâncias na floresta. A entrevista foi editada para ficar mais curta e clara.Como o Amazônia Real está cobrindo a epidemia?
Começamos a nos organizar para trabalhar em casa no dia 13/03. A maioria de nós já tem escritório, mas a gente viu quem não tinha celular e começamos a organizar para as pessoas não terem custos. A partir do dia 15/03, todos estavam em casa trabalhando. Só o fotógrafo, que é o Bruno Keling, está na rua. Temos uma rede de 42 jornalistas colaboradores em todos os estados na região amazônica e eles também estão trabalhando em casa.
Estamos produzindo bastante porque estão todos acompanhando a situação nas suas cidades, monitorando a situação de indígenas, ribeirinhas, quilombolas, a população tradicional da Amazônia.
A gente começou a identificar o aumento dos casos e também a situação dos próprios indígenas, dando atenção muito ao que eles estavam fazendo. Os Huni Kuim por exemplo tomaram a providência de usar uma casa que têm na cidade para que os indígenas que saíssem da aldeia ficassem lá de quarentena . Nossa cobertura é muito segmentada, fomos fazendo perfis, ouvindo especialistas, para que eles também soubessem do que estava acontecendo porque nosso site é muito lido pelos indígenas. A gente manda via Whats para eles.
E a relação com a equipe?
Também temos conversas a cada semana com os repórteres para saber como todos estão. A gente se fala o dia inteiro, mas é muito importante saber como cada um está, se ver. Tem uns que moram sozinhos, outros dividem as tarefas com a família e tem de fazer tudo. Manter o equilíbrio entre trabalho e família acho que é o mais difícil nessa cobertura porque não estamos viajando nem dentro da redação, estamos em casa. Temos de parar, fazer almoço, colocar água nas plantas, cuidar da alimentação. Acho que esse é o maior desafio.
Você enxerga mudanças ocorridas nesta cobertura que podem transformar e orientar a produção jornalística da iniciativa para sempre?
Acho que a grande mudança vai ser acompanhar uma pandemia, que a gente nunca tinha passado na vida. A gente tem o histórico de uma pandemia 106 anos atrás, que foi a da gripe espanhola. Nem minha avó, que morreu com 93 anos, contou muito sobre isso pra gente.
Vocês têm recursos suficientes ou tiveram alguma oferta de apoio?
Defendemos liberdade de expressão e direitos humanos. A gente não recebe recurso públicos de governos, para não interferir na liberdade de expressão e linha editorial. Aqui na Amazônia isso é muito forte, os governos apoiam a mídia e acaba ficando atrelada a esse poder. Também não recebemos dinheiro de empresas que cometem crimes ambientais e de trabalho escravo, que estejam envolvidas com corrupção, violência contra a mulher. Nos financiamos com recursos da Fundação Ford e doações de leitores .