Oi, gente, tudo bem?

Nina aqui 🙂 Não, eu não voltei pra Énois…rs. Mas como conselheira e apoiadora do trabalho da organização, fui convidada pela Isa a escrever pra vocês sobre um assunto que tenho me dedicado e pesquisado muito: a relação entre ecossistemas locais de informação e o financiamento público do jornalismo.

Na semana passada participei de uma edição do Redação Aberta em que conversamos, eu e Paulo Rená, Co-Diretor Executivo na AqualtuneLab e membro da Coalizão Direitos na Rede, sobre a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, a 2630, também popularmente conhecida como Lei das Fake News. Um projeto de lei criado em 2020 para estabelecer as diretrizes que regulamentam as plataformas no Brasil.  


Paulo introduziu o assunto apontando as falhas e problemáticas do projeto, sendo uma delas ligada ao Artigo 38, que estabelece a remuneração de jornais e jornalistas pela publicação de seus conteúdos nas plataformas. O Artigo se baseia na experiência implementada na Austrália, que aprovou, em 2021, uma legislação semelhante com o objetivo de transferir recursos das empresas de tecnologia para financiar o trabalho de jornalistas. Segundo a Columbia Journalism Review (leia em português aqui), a lei gerou falta de transparência dos acordos entre plataformas e jornais, protegidos por cláusulas de confidencialidade, e deixou para as plataformas o direito de escolher os valores e com quem negociar.

No fim, a gente sabe nas mãos de quem esse dinheiro vai parar, não é mesmo? Se você não sabe, eu te respondo: dos grandes jornais e canais de TV – a boa e velha “mídia tradicional”. 

Então a pergunta que fica é: mais dinheiro resolve a desigualdade de informação no Brasil?

Eu acredito que não. Do jeito que o projeto de lei está desenhado, ele continua a favorecer a concentração de recursos. Mas o problema é mais complexo do que só o dinheiro. Os recursos que o jornalismo ganhava via publicidade, e que agora foram parar nas plataformas, não são a única, apesar de talvez a maior, causa da instabilidade e do enfraquecimento deste ecossistema. 

Eu e minha colega de pesquisa (e também de trajetória) Iza Moi, co-fundadora e diretora da Agência Mural, escrevemos sobre o assunto num artigo publicado na última edição da revista de inovação social de Stanford. Nele, falamos sobre como é urgente, com uma eleição municipal batendo à porta, pensarmos soluções para a desinformação que atuem de forma integrada, considerando a atuação do poder público e privado nessa articulação.

Isso requer que a gente mude a lente pela qual vemos o jornalismo, incluindo na conta iniciativas que cuidam das necessidades básicas de informação da população, mas que têm os mais diferentes formatos e linguagens. Muitas que, inclusive, não se consideram ou não são consideradas iniciativas de comunicação ou jornalismo, apesar de trabalharem diretamente com produção e disseminação de informação local.

São elas, produzidas a partir de e para seus territórios, que acabam por impulsionar a participação democrática dos cidadãos nos locais onde vivem e geram pertencimento e conhecimento para suas comunidades, muitas vezes mais do que jornais locais. E são elas que – ao exercerem protocolos para checar e disseminar informação – deveriam estar também contempladas nos desenhos de políticas públicas e de investimentos privados que querem, no fim do dia, acabar com a desinformação.

1.Mas o que são, afinal, ecossistemas de informação?

Ecossistemas de informação são a somatória de pessoas e organizações que produzem, verificam e distribuem informação de interesse público dentro de um espaço geográfico, ajudando a manter uma infraestrutura cívica vital para o funcionamento de uma comunidade, como segurança, educação de qualidade e saúde pública.*

*Richard C. Harwood, Assessing Community Information Needs: A Practical Guide, Washington, D.C.: The Aspen Institute, October 2011.

2.O que você precisa saber?


O contexto atual:

1. Epidemia de desinformação local: o acesso à internet sem educação para a mídia tem provocado crises sem precedentes nos processos eleitorais.

2. Desertos de notícia: metade dos municípios brasileiros não possuem cobertura jornalística local.

3. Aprofundamento da crise do modelo de negócios do jornalismo: o que inclui uma concentração dos recursos vindos da filantropia para intermediários do campo jornalístico.


O que precisa ser feito:

1. Território: fomentar uma lógica autônoma de produção e consumo de informação, a partir do local, é um ciclo virtuoso que contribui a curto prazo na construção democrática.
2. Ações sistêmicas: atores interessados na construção democrática a partir da produção jornalística devem ampliar e descentralizar seus investimentos de forma a promover um olhar mais complexo para o campo, incluindo iniciativas que dão conta das necessidades básicas de informação do cidadão e que não fazem parte da indústria.

3. Políticas públicas: não há solução possível para a construção da democracia se ela não parte do nível local de participação cidadã. Os governos precisam criar mecanismos de fomento direto a esse ecossistema, com autonomia para os municípios.