Como a Énois sabe que está fortalecendo a diversidade no jornalismo?
A partir dos dados, sabemos que a rede da Énois é negra e feminina. Criamos metodologia e processo para fazer isso e abrimos o caminho que trilhamos para fortalecer mais ações em defesa do jornalismo representativo e democrático
O jornalismo reflete a diversidade racial existente no país nas suas redações? De acordo com a pesquisa Perfil Racial da Imprensa Brasileira dá pra dizer que não. Apenas 20,10% dos jornalistas das redações do Brasil declaram-se negros (pretos e pardos) e 0,20% indígenas; enquanto 77,6% dos jornalistas se declaram brancos num país majoritariamente negro, conforme aponto os dados do IBGE 2010, que mostra que 56,20% da população brasileira se autodeclarar negra e que existem existem 817,9 mil indígenas no Brasil, sendo aproximadamente 0,26% da população do país.
O jornalismo que a Énois fortalece é outro: de maioria negra e com maior representatividade indígena. De forma ativa, a organização busca contrapor a realidade homogênea do jornalismo e mostra que é possível realizar um jornalismo mais diverso, inclusivo e representativo. Hoje, a rede de jornalistas e comunicadores negros, indígenas e LGBTQA+ apoiada por meio de programas, projetos e serviços são 66,7% das pessoas negras, 28,7%, brancas e 4,6% indígenas.
Essa rede de jornalistas produziu quase mil reportagens posicionadas a partir da lente dos territórios e das identidades, entre 2021 e 2022, e alcançou uma audiência de aproximadamente 5 milhões de pessoas.
Como saber se estamos ajudando a construir uma democracia mais efetiva a partir da equidade no jornalismo? São os dados que ajudam a Énois a entender se está no caminho de fomento à diversidade e representatividade no jornalismo brasileiro.
Cultura de dados
Conhecer o perfil da equipe, do público com quem está trabalhando é uma forma de as organizações identificarem se estão conseguindo fazer essa construção. Foi o primeiro passo da Énois.
Para ir além, a Énois estruturou a área de Tecnologia da Informação e Dados, que mapeia resultados e impactos, ou seja, mede o que a organização está fazendo, onde está chegando e as transformações geradas a partir da atuação. “A gente da área de dados vai dar aqueles insights, vai falar, por exemplo, que estamos contratando mais gente do sudeste do que das outras regiões. Mas, quem vai dizer se isso é um problema ou não é a organização”, pontua Lucílio Correia, coordenador da área de TI e Dados da Énois. “É preciso lembrar as pessoas que são elas que fazem a análise.”
É através dos dados dos programas e projetos que é possível afirmar que a rede da Énois é negra e feminina: as mulheres cisgêneros representam (68,7%) do público dos programas e projetos da organização.
Esses dados ajudam o laboratório de jornalismo a pensar como o seu trabalho dialoga com a realidade social e contexto que está inserida, a partir do entendimento e reconhecimento do que é feito. Além disso, a cultura de tratamento dessas informações contribui na construção de planejamentos estratégicos mais assertivos, com base em indicadores práticos e reais, o que melhora a comunicação entre as diferentes áreas da Énois e enriquece a construção de narrativas construídas pela entidade.
A agente de Impacto da Énois Michelly Melo destaca que um dos grandes desafios é traçar uma narrativa a partir dos dados. “O dado por si só não vale de nada. Enquanto mulher negra da periferia de São Paulo, acho muito importante que a gente passe a pensar mais sobre as narrativas e dados e que esse não seja mais um conhecimento fechado e hermético, que as pessoas tenham a noção mínima de tratamento como eu tenho.”
Pensando nessa democratização do conhecimento e na importância de medir os resultados das ações, a Énois sistematizou um passo a passo de como as redações, organizações ou coletivos podem implementar uma cultura de dados:
1. Defina objetivos para sua organização. Listar o que você espera como resultado do seu trabalho vai te ajudar a entender o que você faz enquanto organização e a focar naquilo que te deixa mais perto de alcançar seus resultados. Com isso, você poupa energia e recursos de equipe, buscando fomento ou participando de projetos que realmente estão alinhados com as suas metas.
2. Estabeleça metas e indicadores. Definindo os objetivos, você vai precisar saber se o trabalho realizado tem feito sua organização chegar onde queria. Para isso, você vai precisar acompanhar os avanços ao longo do tempo. Por exemplo: um dos objetivos da sua organização é ter uma equipe mais diversa, então sua meta é “aumentar em 50% a contratação de mulheres em um ano” e o indicador que você vai usar para avaliar isso é o “número de mulheres contratadas no último ano X período anterior”.
3. Crie uma rotina de cuidado com os dados. Você não vai conseguir acompanhar o desenvolvimento de um objetivo se não alimentá-lo com informações atualizadas. Uma vez por mês (ou outro período mais adequado ao cronograma do seu projeto), atualize as informações, lembrando sempre de padronizar a forma como você armazena, o que facilita a análise comparativa.
4. Engaje sua equipe. Se possível, construa as metas de sua organização junto com sua equipe. Afinal, cada integrante é parte importante para que os objetivos comuns sejam alcançados.
5. Revisite trabalhos e conte os impactos para o mundo. Seu trabalho pode gerar um impacto que você não estava esperando e isso pode demorar muito tempo a aparecer. Portanto, registre os impactos que chegam até você e, de tempos em tempos, converse com as pessoas envolvidas naquele trabalho/projeto para saber se houve algum desdobramento. Depois, conte para o mundo, pois isso é uma forma de mostrar a seriedade e relevância do seu trabalho.
Segurança da informação
A coleta e tratamento de dados pode ser realizado por qualquer empresa ou iniciativa que necessite manter informações estruturadas e sistematizadas, porém é preciso garantir a segurança das informações coletadas. Atualmente vivemos em uma era em que as informações pessoais são valiosas, devido à chamada “economia de dados”, termo usado quando os dados são base de negociações.
O uso indevido dos dados pessoais pode gerar sérias punições previstas na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, A LGDP garante a privacidade de informações pessoais, como endereço, telefone, idade, e-mail, entre outras. Além disso, a lei obriga que sites e empresas, por exemplo, informem como os dados são tratados, armazenados e para qual finalidade.