25 de Fevereiro de 2019
Iniciativas no Brasil e nos EUA estão levando a alfabetização midiática para salas de aula e fortalecendo a leitura crítica das informações
É a continuidade de 2018, o ano da polarização ou da morte do consenso. E em que o Brasil viu redações se unirem escolhendo a checagem contra a desinformação.
O Comprova juntou 24 redações, a Agência Pública criou uma rede local de checagem, a Globo se integrou internamente, as agências Lupa e Aos Fatos centraram fogo nas eleições. O ChecaZap, da Énois, se infiltrou em grupos de WhatsApp para checar as mensagens de grupos ligadas à eleição.
Num balanço rápido, o esforço de todas as iniciativas acima rendeu por volta de 1.000 checagens durante todo o processo eleitoral, parecendo inglório diante da avalanche de mensagens nos grupos partidários de WhatsApp e da aparente crença inabalável nas informações recebidas.
Só nos 347 grupos monitorados pelo projeto Eleições Sem Fake, da UFMG, foram postadas mais de 800 mil mensagens no período. O ChecaZap coletou 600 mil mensagens em 370 deles. As correntes de conspiração e desinformação atravessaram as eleições e, pior, continuaram a ser acreditas e replicadas mesmo após corrigidas.
Uma mudança estrutural depende da integração da imprensa, das empresas que são parte do problema – leia-se Facebook e Whatsapp –, dos legisladores e executores de políticas – que vão elaborar e fiscalizar os crimes online. Mas o buraco está mais embaixo.
Passa por falar de como se constrói informação, interpretação de texto, discurso de venda, jornalismo e seu papel social, e também segurança na internet. Passa pela sala de aula. É por meio de iniciativas de educação para a informação que se consegue orientar no descontrole informativo, distinguindo entre o que é informação com lastro e o que é teoria conspiratória ou opinião – como falamos ao Ijnet.
O Brasil tem 22 iniciativas de ensino de educação midiática em sala de aula, de acordo com um levantamento do Instituto Palavra Aberta – educação digital, desinformação, produção de jornalismo e outras ações formativas mais pontuais nem foram contabilizadas. A Énois está estimulando o fortalecimento e a estruturação delas por meio da formação para o jornalismo em sala de aula, que no ano passado alcançou 150 professores do país.
São iniciativas independentes, que ensinam a buscar informação, a verificar se uma fonte é confiável, a interpretar texto e imagens para entender qual o objetivo da mensagem, a desenvolver senso crítico e capacidade de se orientar num ambiente informativo hard core. Uns se chamam de jornal laboratório, outros educação midiática, alfabetização, letramento midiático.
Pra fortalecer o que fazemos e fazer junto, a Énois foi aos EUA – à convite do governo americano – conhecer projetos bem estruturados. A Associação Nacional de Educação Midiática começou a ser formada nos anos 90 por lá. Tem jornal científico estudando o impacto do ensino e desde o início integra acadêmicos da área de educação, jornalistas, professores e médicos. Sim, médicos.
Nos EUA, a alfabetização midiática tem uma interface grande com a saúde, já que muito da desinformação tem tradicionalmente este foco. Aí fazem treinamento de novos pediatras para melhor capacitá-los a receber e dar informações ligadas aos laboratórios farmacêuticos. A ideia é que médicos e pacientes pouco críticos e questionadores dos medicamentos vão ser presa fácil para a propaganda. No mesmo sentido, tem vários projetos ligados ao ensino básico, com a conscientização sobre anúncios e marketing.
► As duas previsões para 2019 mais lidas entre as mais de 200 produzidas peloNiemanLab foram sobre racismo. Na primeira, It finally sinks in that some people aren´t white, Janée Desmond-Harris, editora de opinião do NYT, pergunta “quem significa nós para o jornalismo?”. Essa pergunta precisa ser respondida com precisão. Na segunda, Errin Haines Whack, jornalista especializada em raça e etnia da Associated Press coloca que a questão central é o não enfrentamento do racismo, o que faz com que as reportagens e o rascunho da história feito pelo jornalismo seja menos fiel. Nome do texto é uma cutucada: “Repita comigo: racismo“.
► O WordPress está lançando o Newspack um publicador voltado para iniciativas de jornalismo local e que promete ajudar na sustentabilidade. As adesões são grátis, mas depois o uso vai para entre US$ 1.000 e US$ 2.000, diz o NiemanLab.
► Facebook cria fundo de US$ 300 milhões para investir em imprensa local. Por ora, nos EUA e Inglaterra, via NiemanLab.
► No Congo, uma tentativa de lutar contra a desinformação sobre os supostos perigos do tratamento do Ebola une governo e outras entidades informando via WhatsApp, rádios locais e líderes comunitários e religiosos, diz texto do NiemanLab.